Em eventos completamente distintos, tempos atrás, caíram-me nas mãos estes dois pequenos poemas, de autores igualmente distintos:
Quem és tu, caro leitor, lendo estes poemas daqui a cem anos?
Não posso te enviar uma só flor de toda a riqueza desta primavera, nenhum raio destas nuvens douradas...
Abre tuas portas, e olha ao redor!
Colhe de teu jardim as perfumadas lembranças das flores que murcharam cem anos antes... Talvez recebas em teu coração a alegria viva que te envio nesta manhã de primavera, ecoando sua voz feliz através destes cem anos.
Rabindranath Tagore (1861-1941)
Agora cheio de vida, pleno, visível,
Eu, com quarenta anos de idade no octogésimo terceiro ano dos Estados Unidos,
Para alguém daqui a um século ou a muitos séculos,
Para ti ainda por nascer, estas palavras, procurando-te.
Quando as leres, eu que estava visível, estarei invisível
E tu serás pleno, visível, entenderás os meus poemas, procurando-me,
Imaginando como serias feliz se eu pudesse estar contigo e ser teu companheiro.
Que assim seja como se eu estivesse contigo. (Não estejas tão certo, mas eu estou neste momento contigo).
Walt Whitman (1819-1892)
Num instante, Tagore e Whitman entregaram-se à imortalidade insegura e crua: a anônima continuidade da mente humana. Tagore, Withman, não importa quem. A mente que experimento carrega a condição humana, ou a condição humana carrega a mente que experimento. Naquele exato momento, inclusive parei da vastidão contemplativa, estavam vivos comigo.
Um comentário:
Amigo Eltinho,
Mais uma sincronização, da minha cabeça...de coração aberto.
bj
PROVINCIA DESERTA - Ezra Pound
Em Rochecoart,
Onde colinas se partem
em três vias,
E três vales, cheio de estradas sinuosas,
Bifurcadas para sul e norte,
Há um lugar de árvores... cinzentas de líquen.
Caminhei ali
pensando em dias idos.
Em Chalais
um arvoredo se entrelaça:
velhos pensionistas e velhas protegidas
Tem seus direitos lá -
isso é caridade.
Trepei nos velhos caibros,
fitando abaixo
Todo o Dronne,
toda uma correnteza cheia de lírios,
A leste vai a estrada,
Aubeterre fica a leste,
Com um velho tagarela na taverna.
Conheço as estradas no lugar:
Mareuil a nordeste,
La Tour,
Há três fortes perto de Mareuil,
E uma velha feliz em ouvir Arnaut.
Feliz em arranjar roupas secas.
Caminhei para
Perigod,
Vi as flamas das tochas,saltando
Pintando a fachada daquela capela;
Ouvi, na escuridão, risos ao redor.
Olhei de novo sobre a torrente
e vi a alta construção,
Vi os longos minaretes, os brancos zimbórios
Fui a Ribeyrac,
e em Sarlat,
Escalei degrais frágeis, ouvi sobre Croy,
Andei pelo velho cenário de En Bertran,
Vi Narbonne, e Cahors e Charlus,
Vi Excideuil, enfeitada com esmero.
Eu disse:
"Aqui um tal homem andou.
Aqui Coração de Leão foi morto.
Aqui se ouviu bom cantar.
Aqui alguém apertou o passo.
Aqui alguém ficou a ofegar"
Olhei ao sul em Hautefort
Montaignac em mente, ao sul
Descansei em Rocafixada,
vendo o pôr-do-sol,
Eu vi cobre descendo
tingindo as montanhas,
Vi os campos, pálidos, claros como esmeraldas,
Picos abruptos, cumes altos, castelos distantes.
Eu disse: 'As antigas estradas ficavam aqui.
Homens passaram por tais e tais vales
Onde as grandes aléias ficavam mais juntas."
Vi Foix, na própria rocha, vi Toulouse, e
Arles muito alterada,
Vi a arruinada 'Dorata'.
Eu disse:
'Riquier! Guido!'
Pensei na segunda Tróia,
Um lugarzinho desprezado em Auvergnat:
Dois homens lançam a moeda, um mantém um castelo,
Um vai para a estrada.
Ele cantou uma mulher.
A canção levava a Auvergne:
O Delfim o apoiava.
'O castelo para Austors!'
'Pieire continuou a cantar -
Um homem bom e agradável.'
Ele conquistou a dama,
Roubou-a para si, defendeu-a contra a força armada:
Assim acaba a história.
Aquela época se foi;
Pieire de Maensac se foi.
Caminhei por essas estradas;
Pensei neles como se vivessem
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